Carta de Juscelino Kubitschek a Vera Brant (1973)
A professora Vera Brant, mineira de Diamantina, é empresária e escritora, além de conterrânea do lendário presidente do Brasil. Inspetora de ensino do antigo Ministério da Educação e Cultura, colaborou com Darcy Ribeiro na criação da Universidade de Brasília, da qual foi afastada pelo regime militar. Amiga de ambos, manteve extensa correspondência com eles ao longo da história. Vera reside atualmente em Brasília.
Rio de Janeiro (HB)
6 de dezembro de 1973.
Minha boa amiga Vera Brant. Estou no Rio, mas não se extinguiu em mim, em minha capacidade de sentir, a lembrança dos instantes admiráveis que você, com sua graça, simpatia e inteligência soube proporcionar-me em Brasília. E penso, com a larga experiência dos homens e das coisas, que nada tão precioso quanto receber bem, integrando o visitante na atmosfera que o rodeia.
Na sua casa, usufruindo de uma hospitalidade tradicionalmente afamada, tive a impressão de que um pedaço da nossa Diamantina se deslocava de seus serros alcatifados e vinha ao Planalto envolver Brasília, envolvendo-a na sua totalidade.
As noites de estrelas iluminando as distâncias formavam o cenário de sua poesia comovente e tão delicada, às vezes tisnada de um realismo que contunde sem ser, no entanto, o mórbido pessimismo. Humana e sensível como é natural que a depressão a visite, mas a reação vem da musa que fala em seu estro:
Não deixarei que a madrugada
avance sobre meu tédio
e o meu cansaço.
Ela que ameaça auroras
e que só traz dias iguais.
A seu lado, querida amiga, minha estrada em Brasília assumiu aspecto diferente, e embora não seja dado a confidências, uma insisto em fazer-lhe: Brasília, nesses anos tempestuosos que o destino me impôs, deprimia-me quando aí, por uma circunstância ou outra, tive de estar. Possivelmente minha capacidade de assimilar vacilasse entre o esplendor do passado, quando então a construímos, e estas intermináveis horas de borrasca. Desta vez, em sua casa, pude respirar aura de grande ternura, achando espalhada por todos os cantos a mensagem de um carinho tão sincero. E a quem devo tudo isso senão a você, à sua bondade, à sua capacidade de ser útil, de levar a todos a alegria que mora em seu coração.
Li os seus versos. Belos, fluentes, e não só os aprecio como deles me envaideço. É o espírito de Diamantina que flui nas suas veias, que desce de tão alto para viver em você, tornando-a afetuosa convergência.
Receba o meu grande e reconhecido abraço.
Juscelino Kubitschek
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